Publicado: 05/08/2021 às 13:08
Por: COMUNICAÇÃO CBTP | Categoria: NOTÍCIAS CBTP

O perigo de se atirar com calibres de fuzil em Aço AR500.

Me chamo Eduardo Valladares Guimarães , sou atirador e fabricante de alvos metálicos desde 1996. Sou Engenheiro Mecânico e trabalhei por 30 anos no grupo Usiminas, com boa experiência neste período atendendo a área militar.

Devido a liberação do calibre 5.56 para atiradores e a crescimento da quantidade de clubes de tiro em todo o país resolvi fazer este texto em linguagem simples para esclarecer o perigo do uso deste calibre em alvos em AR500.

Como fabricante de alvos, recebo diariamente pedidos de cotação de alvos para suportarem o 5.56., inclusive para serem instalados em stands indoor com comprimento de menos de 10 metros. Procuro esclarecer o perigo disto aos possíveis clientes e simplesmente opto por não fazer a venda.

Em conversa com o presidente da CBTP optamos em fazer este texto para orientar atiradores e proprietários de clubes quanto a este perigo.

Aço AR significa Abrasion Resistence (Resistência a Abrasão). São uma família de aços que foram desenvolvidos para atendimento ao setor de mineração. Para equipamentos que tem contato direto com minérios de alta dureza e para resistirem aos mesmos tem de ter igualmente elevada dureza. Aços de elevada dureza mostraram-se eficientes para resistência balística.

O texto em questão tem o objetivo de esclarecer uma questão muito simples, que é a diferença em termos de segurança do atirador e dos presentes quando comparamos um tiro em um aço comum (entenda-se SAE1020 ou ASTM 572) e em aço AR 450 ou acima.

Vamos aos fatos científicos:

Todo corpo em movimento tem uma energia, ou capacidade de realizar trabalho, ou ainda capacidade de causar estrago devido ao impacto com outro corpo. Esta energia é a Cinética:

Ec= ½ mV²

Ou seja, o projétil tem grande parte de sua energia devido a sua velocidade e outra parte menor devido ao seu peso.

Quando um projétil atinge um corpo, ou alvo, toda esta energia cinética é convertida em outros tipos de energia, pois é um princípio fundamental que energia se converte mas não se elimina. Ao atingir um corpo ou alvo de aço a maior parte da energia será convertida para deformar este corpo. Outra parte será convertida em calor devido ao enorme atrito. Outra parte ainda será convertida para deformar o próprio projétil, tanto o miolo de chumbo quanto a jaqueta.

Qual a grande diferença entre se atirar em um aço de baixa resistência e em outro de elevada dureza? O aço de baixa resistência ou dureza consumirá grande parte da energia do projétil para se deformar até o ponto de se romper (ou furar) se for o caso. Parte menor da energia será gasta para deformar este projétil, talvez estilhaçá-lo e projetar estes estilhaços para alguma direção.

Quando se atira com um calibre 5.56 em um alvo de aço de baixa resistência, onde temos um projétil de baixo peso  e uma velocidade muito alta, também a maior parte da energia será usada para deformar o aço.

Projéteis de fuzis comuns são feitos de uma liga de chumbo revestidas com uma capa de latão. A função do latão é isolar o contado do chumbo com o raiamento do cano, pois devido às elevadas velocidades e consequentemente o atrito entre ambos causariam o derretimento do chumbo no cano e o famoso chumbamento do cano com a perda da precisão do disparo.

Na metalurgia existe uma regra simples, a pior condição de um metal é após fundido. A quantidade de defeitos internos é imensa. A medida que este metal é trabalhado melhor vão ficando suas propriedades mecânicas. Após a fundição vem a deformação (ou laminação na maior parte das vezes) e até chegar ao melhor que seria o forjamento (como se faz com aços para facas).

Então o chumbo do projétil é praticamente o material fundido e tem todos os defeitos internos que poderiam ter, além do fato do próprio chumbo ser um metal de baixíssima resistência mecânica e baixo ponto de fusão. Já a jaqueta que normalmente é feita em latão cartucho 70-30, é um material de muito maior resistência mecânica e de maneira geral grande resistência a ruptura.

Outro fator importante de ser esclarecido é que todo metal tem defeitos internos, e são estes defeitos que permitem que eles se deformem. È como se fosse, tem um buraco aqui, outro ali e as coisas vão se acomodando e deformando. E o chumbo fundido tem muito defeito.

Quando se atira com um calibre 5.56 em um alvo de aço com baixa resistência uma pequena parte da energia do projétil é gasta para praticamente vaporizar este chumbo. Por ter tantos defeitos internos o chumbo se deforma muito facilmente, como a velocidade do disparo é muito alta, estes defeitos internos do chumbo não tem tempo para se acomodarem e então o chumbo do projétil praticamente implode em pedaços minúsculos.

Entendido isto, temos o disparo em um alvo de aço AR com 5.56. A grande parte da energia que seria gasta para deformar o alvo não é utilizada porque a superfície do mesmo simplesmente não cede a energia do projétil. A quantidade de energia convertida para “vaporizar” o chumbo praticamente é a mesma pois o chumbo é o mesmo.  Então o alvo não se deformou, o chumbo “vaporizou”, para onde vai a energia? JAQUETA.

A jaqueta é de latão com boa resistência, pouquíssimos defeitos internos, pois veio de uma chapa laminada e com vários tratamentos térmicos no seu processo de fabricação para melhorar suas condições de resistência.

IMPORTANTÍSSIMO: percentualmente ao peso do projétil, a quantidade em peso de latão em um projétil de 5.56 é maior que em um projétil de .50.

Grande parte da energia que seria absorvida para deformar o aço, o que não ocorre no AR, vai para deformar e impulsionar a massa de jaqueta.  É absurdamente alta a velocidade que um estilhaço de jaqueta pode ser impulsionado.

O Grande perigo de se atirar com projéteis de 5.56 em alvos AR são os estilhaços de jaqueta.

As velocidades que os mesmos podem atingir podem ser muito maiores que as do próprio projétil. E a jaqueta não se “vaporiza” como o chumbo do miolo, no máximo se fragmenta em pedaços consideráveis para danos e normalmente em formatos de lâminas.

O texto acima foi escrito com o intuito de ser compreendido por todos de qualquer formação acadêmica. Pontos específicos e mais técnicos estamos abertos ao debate.

Nos Estados Unidos existem estudos sérios feitos pelo Exército Americano e FBI onde não se recomenda o tiro em calibres de fuzil em aços AR a menos de 50 metros de distância.

 

Muito grato à todos e certo de que com a compressão deste texto poderemos evitar acidentes no nosso esporte e por que não na nossa sociedade.

Att

Eduardo Valladares

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