A idade ela prefere não revelar, diz ser segredo de Estado. Em 24 anos dedicados à corporação, a amapaense foi a primeira mulher a receber a patente de tenente coronel.
Em meio à rotina corrida, Palmira encontrou tempo para se dedicar a uma paixão, que na verdade considera uma terapia: o tiro prático. Apesar do esporte ser considerado masculino, a militar conquistou seu espaço, sem perder o toque feminino.

– Não vou a uma competição sem antes estar bem maquiada, com penteado feito e bem arrumada. Já é um ritual que faço tanto nas competições como no ambiente de trabalho – contou.
O gosto pela prática de atirar surgiu após sua entrada na corporação, em 1989. Na época, Palmira relembra que tinha dificuldades em manusear a arma, pelo peso do objeto e também por ser canhota, mas que eram compensadas pela pontaria.
– A precisão e a concentração durante o momento do tiro são características que acredito ter trazido comigo. No início, meus colegas de trabalho brincavam, me chamando de pistoleira do norte, atiradora de arco e fecha, entre outros apelidos – conta a coronel, bem humorada.
Início da carreira
Em 1992, Palmira participou de um curso de oficiais no Rio de Janeiro. No período que ficou na cidade, a coronel conheceu militares dirigentes da Federação de Tiro do Rio e de outros estados, os quais a incentivaram a participar de competições do esporte. Sua primeira participação em campeonatos brasileiros foi em 1995, no Paraná. Na estreia, conquistou o terceiro lugar.

– Na época fui a única representante do Amapá e uma das poucas mulheres na competição. Todos ficaram surpresos com meu resultado, inclusive prestei várias entrevistas para a imprensa da cidade. Todos queriam saber mais sobre mim e sobre o meu estado – sorriu.

A partir da primeira conquista, a militar participou de várias competições locais, regionais e nacionais. Conquistou cerca de 200 medalhas e troféus nos últimos 18 anos, só em campeonatos brasileiros, foram 2 ouros, 2 pratas e 4 bronzes. O título mais recente foi conquistado em junho, quando ganhou o ouro no Campeonato Regional em São Paulo, pela categoria master, com rifle de mira ótica, a 100 metros de distância.

– Fiquei feliz por ter vencido em uma categoria que não é minha especialidade. Disputei com muitos homens e mulheres com elevado nível técnico e favoritos ao título, mas felizmente, consegui ser a vencedora, – alegrou-se.
Além do tiro prático, Bittencourt também conheceu o judô. A militar ganhou gosto pelo esporte e se qualificou para atuar na arbitragem.

– É um outro esporte que tenho muito amor. Já atuei na arbitragem em competições nacionais e internacionais realizadas no Estados Unidos, China, entre outros países. Queria encontrar mais tempo para me dedicar ao judô, mas por enquanto, não tenho uma brecha em minha agenda – disse.
Federação de Tiro
Após uma temporada de premiações em torneios de tiro prático, a coronel resolveu trazer o esporte para o Amapá, fundando a Federação Amapaense de Tiro Prático, juntamente com o oficial Ubiraelson da Silva. A entidade existe há 10 anos e realiza um trabalho de capacitação, formação e educação acerca da legislação sobre armas de fogo para militares e sociedade civil.

– Tive a necessidade de tornar popular o tiro prático no Amapá. Queria que outros colegas assim como eu, tivessem a oportunidade de disputar provas locais e representar o estado em competições regionais e nacionais e quebrar o mito de só quem pode atuar no esporte são os militares, ao contrário, qualquer pessoa pode participar, desde que estejam dentro das normas que a lei impõe – esclareceu a militar, que também atua como instrutora e presidente da federação.
A experiência lhe rendeu o credenciamento da Polícia Federal, o qual lhe dá aval para aprovar e reprovar requerimento de pessoas que querem portar uma arma de fogo.
– Das mortes causadas por arma de fogo, cerca de 80% delas são decorrentes de causas acidentais. Em razão disso, tenho feito um trabalho pedagógico intenso com as pessoas que querem se filiar a federação, pois a lei é muito rígida em relação ao porte de armas em geral, – ressaltou.
Grandes momentos
Apesar das grandes conquistas, nem tudo foi fácil para a coronel. No início de sua carreira policial, Palmira relata que sofreu preconceito por parte dos outros militares. Um dos grandes desafios foi quando assumiu o comando de uma companhia, onde trabalhavam cerca de 180 homens.

– Era um local muito problemático, com muitas falhas administrativas. Muitos policiais pediram para sair pois se recusavam serem chefiados por uma mulher. Foi muito difícil ter que lhe dar com essa rejeição. Mas com pulso firme e disciplina, solucionei os problemas e consegui ganhar o respeito dos companheiros – conta emocionada.

(Foto: Palmira Bittencourt/Arquivo Pessoal)
Atualmente, Palmira atua na ajudância geral do comando da PM e faz parte do time das brasileiras que realizam dupla jornada de trabalho e em casa. Divorciada, cuida de dois filhos: uma menina de 10 anos, e um garoto de 17 anos.
– Meu filho é altista e tive que lhe dar com o problema desde cedo. Com ajuda de Deus, da minha filha caçula e da família, consegui vencer a limitação. Hoje ele cursa o primeiro ano do ensino médio e é um dos melhores alunos, um orgulho para mim. Meus filhos me dão força para continuar em minha carreira e os amo de todo coração – emocionou-se.
No lar, enfrenta as dificuldades diárias de uma dona-de-casa: limpa os compartimentos, prepara o almoço, café da manhã e leva as crianças para a escola. As regras e comportamento impostas no lar são na base da disciplina aprendida na corporação.
– Eu tenho que me virar nos 30. Em casa o regime é militar, tem hora para tudo. A gente acorda às 6h, a tarde sento com os meninos para fazer o dever de casa, e às 20h vão dormir. Quando as crianças dormem é que vou a malhar e preparar o almoço do dia seguinte – comentou.
Passatempo

Quando não está no ambiente de trabalho e nos treinamentos, a coronel leva uma rotina comum. É nos momentos de lazer que desenvolve outras atividades.
– Eu gosto de desenhar, pintar e escrever. Estou produzindo um livro que está pela metade. Pretendo terminá-lo até o fim do ano. Sou uma pessoa caseira que prefere viajar para o interior, pescar, namorar e estar com os meus filhos – contou.

Palmira atribui a capacidade de exercer várias atividades à disciplina que obteve na corporação e nas experiências pessoais que adquiriu durante o tempo.
– Acredito que quando fazemos as coisas com amor, interesse e dedicação conseguimos vencer as dificuldades diárias que a vida lhe oferece – finaliza.
- FONTE: GLOBOESPORTE.COM Macapá-AP
- Cassio Albuquerque com orientação do editor Wellington Costa